terça-feira, 15 de junho de 2010

segue a nau - segue o jardim


Noia & Poesia
" ... como dito, não fui um grande jogador de futebol, nunca toquei instrumento, dinheiro só tive em sonho e criminoso apenas fui em pesadelos ..." Deribaldo Santos





"

É melhor ser alegre que ser triste
Alegria é a melhor coisa que existe
É assim como a luz no coração

Mas pra fazer um samba com beleza
É preciso um bocado de tristeza
É preciso um bocado de tristeza
Senão, não se faz um samba não"

vinicus/baden



nossos brasis, nossos jardins, nossa literatura:

é futebol, é marginália
é sgarzella, bandido
vida bandida
sonhos
é poesia, é romance,
de noia, noiado, pirado
pirante

vem pro jardim
fazer sonhos, cirandas, cair água e molhar o rosto no primeiro sonho.

m.frança

segunda-feira, 14 de junho de 2010

lançamento em Quixadá

Cartaz-Noia como janela da alma

O sentimento que invade a alma é alegria
com arrepios pelo corpo
tenho desejos de Borboleta
ou quem sabe de "Sininho"...
Se eu pudesse voar!


Regina Coele Q. Fraga

começando Noia


prefácio


Paraibano de nascença, já faz um tempão que compartilho com os conterrâneos da grande nação nordestina a sina da “triste partida” ou, em sentido mais positivo, a missão de “andar por este país”. Quis o desígnio da Providência – os romanos apelariam para a senhora Fortuna, a deusa do destino – que, antes de seguir para o Rio de Janeiro, para fins de formação profissional, eu aportasse por uma segunda vez em terras cearenses para uma missão de dois anos.

Logo no início desta experiência migratória – cheguei a Fortaleza em fevereiro de 2000 -, afortunadamente conheci uma conterrânea e, através dela, fui acolhido filial e fraternalmente no âmbito de sua família. Esta, de raízes paraibanas, cuja segunda geração nascera e se criara no Rio de Janeiro, experimentou o “êxodo” para a capital cearense.

O seu nome, Pilá; filha segunda dos patriarcas da família. No aconchego de sua casa, muitas vezes ao redor da mesa farta, sempre regada com a bebida que alegra o coração, sentávamos para prosear longa e alegremente. Outras vezes, as conversas se davam próximo de um coqueiro, no quintal da casa. Ali, num recinto pequeno e aconchegante, as dimensões pareciam se alongar quilometricamente quando, transpondo os limites do tempo e do espaço, viajávamos nas longas estórias vividas pelos membros da família desde os inícios telúricos na Paraíba, passando pelos anos heróicos de verdadeira gênese – com a dor e a alegria que todo parto compreende – da prole no Jardim do Noia, até o retorno benfazejo às terras nordestinas. De tanto ouvir aqueles casos, de acompanhar narrativamente a saga daquelas pessoas, aquela história foi ficando familiar, como se paulatinamente eu fosse me tornando – para além da mesma origem batismal e geográfica – um membro também de sangue daquela família.

São estas estórias, pelo menos parte essencial delas, que Deribaldo, sobrinho de Pilá, evoca e revive agora neste seu Um jardim chamado Noia. O título evoca o lugar, na Baixada Fluminense, onde a família morou por aproximadamente 22 anos. De forma direta, simples e coloquial, Deri descreve os fatos, narrando-os quase de uma vez só – como se esvazia sofregamente um copo de cerveja numa tarde ensolarada de domingo. O leitor pode, eventualmente, se atordoar com a virada do copo, mas ficará deliciado com a narrativa dos fatos, com a descrição, por vezes pitoresca, das pessoas e dos lugares, com a riqueza de pormenores e, por que não dizer, marcado também pela dureza do cenário, onde as personagens desenvolvem a trama do seu cotidiano existencial.

Mas o autor não se limita a contar a história. No interior mesmo dos fatos contados brotam desabafos, questionamentos e denúncias que vão se costurando em torno da linha mestra da narrativa: a violência urbana, o êxodo rural, a desigualdade de um sistema social injusto, os sonhos e opções abortados por falta de oportunidade, etc. Questões atualíssimas que nos desafiam a todos. Eu, que conheço uma parcela pequena da favela da Rocinha, vejo este drama social vivido em muitos dos nossos “Paraíbas” que lá vivem e continuam a chegar.

O núcleo da história, contudo, parece-me que está na vivência no interior de uma família que, apesar de todos os percalços e dificuldades, soube cultivar valores sólidos, permitindo aos membros do “clã” não só uma estrutura unida e coesa, como também atravessar com segurança um abismo que os podia levar à marginalidade criminal. Daí a saudade, confessadamente sentida pelo autor, daqueles anos vividos no meio da parentela, inserida no Jardim maior do Noia, com seus folguedos juninos, jogos de futebol e experiências várias de caráter social, religioso e familiar que configuravam uma autêntica vivência em comunidade. Surge, então, a pergunta inquietante: no falso dualismo indivíduo-comunidade, que cada vez mais se impõe nos meios urbanos e abastados, como manter uma saudável e harmoniosa articulação entre os dois pólos? Como encontrar nas famílias de hoje – é o questionamento que o autor faz de si mesmo – pessoas que promovam essa integração? Talvez não concordemos com todas as proposições do autor. Mas a sua voz é sincera, atual e pertinente. O leitor vai conferir ao longo da leitura.

No Jardim do Noia, Deri nos conta que havia uma fruteira estéril, que nunca produziu frutos. Em Fortaleza, na casa de D. Pilá, há um coqueiro sob o qual muitas vezes nos reunimos para ouvir as aventuras da família. Os frutos do coqueiro são abundantes, e a doçura de sua água surpreende a qualquer um. Quem sabe não vejamos aí – nos frutos da terra – a vida e o trabalho recompensados dos patriarcas Isidro e Cassiana?! Assim também somos convidados a vislumbrar, nesta história de Deri, uma frutífera produção de um Jardim chamado Noia. Eu, particularmente, sou grato ao autor pelo convite de prefaciar este livro. E, ao fazê-lo, sinto-me feliz por me considerar um rebento tardio deste Jardim.


Lúcio Flávio






um jardim chamado Noia